Lupicínio Rodrigues nunca tocou nenhum instrumento musical, tocou simplesmente o mais musical de todos os instrumentos: o coração daqueles que choram pelo amor perdido.
Com os cotovelos apoiados no balcão derramou o whisky feito choro na canção e criou a dor-de-cotovelo, o samba-canção.
Cantou o remorso, a vingança, a loucura, o ódio e o amor.
O amor universal.
O amor comum a todos.
Aquele que nos faz sofrer e a gente continua amando.
Cantou a dor.
Uma dor agressiva que nos castiga sem piedade e com rancor.
A dor que bate pra se defender, pra tentar amenizar o sofrimento de apanhar do próprio amor.
“Naquele desespero
De perder o meu amor
Ofereci até um coração
Que não é meu”
Lupicínio Rodrigues canta os amores tristes.
Os amores que ninguém pode negar que existem.
Os amores de vida e de morte.
O amor que trai e o amor traído.
O amor da amizade.
Os bons sentimentos e a maldade.
“Agora você vai ouvir aquilo que merece
As coisas ficam muito boas quando a gente esquece”
Impossível esquecer Lupicínio.
Sua voz pequena era a plataforma para seu coração imenso, disposto a amar e a sofrer.
E ele sofreu todas as dores do amor.
Do lamento rancoroso de “Judiaria” ao amor além da vida de “Carlucia”.
Com voz mansa e coração feroz seguiu a profecia de Noel Rosa, que disse: “Esse garoto é bom! Esse garoto vai longe!”
E foi. Mostrou “que ainda existe o verdadeiro amor”, se sujeitou a ser sacrificado, a salvar o mundo com sua dor e voltar para casa brigando com seu coração.
“Para mim
Só existe um caminho a seguir
É fugir de ti, é fugir
Apesar de ser minha vontade te seguir
Meu dever amor, é fugir”
A dor que procurava Lupicínio era como colírio: que incomoda e traz alívio.
Era a dor que ele cantava para nos mostrar a imensidão do seu amor. Traído, machucado e sonhador.
Lupicínio sempre cantou a dor. A dor que sabemos de onde vem e não passa.
Sempre cantou o amor. O amor que não sabemos de onde vem, e não passa.
“Mas como é que a gente voa
Quando começa a pensar”
Pensar em Lupicínio Rodrigues, feliz poeta do amor triste.
Raphael Vidigal Aroeira
Lido na Rádio Itatiaia dia 8/11/2009.
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